2005/05/03

Casa na Duna - Dia de Sol


Hoje sentei-me sobre a duna
Olhei o brilho curvo até ao céu
Olhei embriaguei-me de olhar
O sol voltou como eu não queria
Pensei na noite negra e nas estrelas

Não sei olhar a luz assim tão forte
Enquanto não voltares

Não quero o sol não quero a chama
Enquanto não voltares

Quero as ondas do mar só nos meus olhos

Depois? Voltar a casa
Talvez voltar…

(Poesia de Monalisa, no Sítio da Saudade e fotografia de João Coutinho)

O Aborto? Por cá tudo bem!

O aborto, por causa da data do referendo, voltou à actualidade.
Ainda há pouco éramos o país do "Cá vamos cantando e rindo..." do hino da Mocidade Portuguesa, a organização da juventude do fascismo lusitano, de filiação obrigatótia no ensino secundário.
Há uns anos atrás, digamos 50 anos, na minha aldeia (a 60 Km de Lisboa!) as mulheres andavam de lenço na cabeça (cabeça tapada como as do Islão!). Se alguma fazia uma "permanente" (arranjar o cabelo) era estigmatizada e tido tal propósito como sinal claro de mau comportamento moral. O fundamental da moral católica girava e ainda roda em torno do sexo!
A mulher não votava, mesmo nas eleições-farsa do nosso fascismo-católico-apostólico-romano do ex-seminarista Salazar e do seu amigo e confrade de lutas político-académicas de ultra-direita, cardeal-patriarca Cerejeira.
O marido era "dono" da mulher e dos filhos. Marido ultrajado na sua honra de macho podia assassinar a mulher sem perigo de grande pena se a apanhasse em flagrante delito com o amante ou mesmo sem flagrante. O divórsio era proibido. Entretanto pedofilia e abuso sexual de menores era, quando muito, apenas coisa que não caía bem, em conversa pública.
Mulher que fosse "desonrada", que se soubesse ter deixado de ser "virgem" e o namorado não casasse com ela estava condenada à tragédia pessoal. Era uma desgraça à mercê de um casamento de favor, com um desgraçado qualquer, sem brio nem honra, ele também, ou então, um convento.
Em Lisboa só se via, e raro, mulher com calças, no Parque Mayer, local de teatros de revista e maus comportamentos.
A revolução do 25 de Abril deu uma volta nos costumes. Foi uma lufada de ar fresco no bafio da sacristia em que o ditador fascista transformara o país. Mas a nossa gentinha reaccionária tem oposto, também nos costumes, a sua muito "católica" resistência e mantido peado o país. Por isso ainda somos o resto da Europa onde mulher que faça aborto é presa.
Os "católicos" reaccionários (numa linha simétrica às dos fundamentalistas do Islão) querem, e têm conseguido, impôr como lei, aos outros portugueses, incluindo outros católicos, o seu preconceito religioso sobre o aborto, supostamente em defesa da "vida". Eles que, como o papa Voytila e Ratzinger, aceitam a pena de morte. Os mesmos que, em geral, são o suporte ideológico das políticas da máxima exploração que condenam grande parte da humanidade à marginalização, à fome e à morte precoce.
Poderiam proibir, no plano religioso, o aborto aos católicos mas sabem que nem mesmo com a excomunhão impediriam as mulheres católicas de o fazer. Em última instância, já se sabe, pois nenhuma mulher anseia por abortar.
Os católicos reaccionários de outrora, num espírito de "tolerância" obrigaram toda a gente a ser católica e aos que resistissem, como no caso dos judeus, "apenas" os mandavam para a fogueira. Agora os tempos são outros, mas onde o tempo é mais antigo, como em Timor, até a casa do bispo serve para fazer "justiça" privada. Por cá as mulheres, não as deles, não as católicas obedientes à ortodoxia, mas todas, escapam à fogueira é certo, mas não escapam à prisão, se em última instância abortarem.