2014/04/27

Francisco Miguel

    

 [um clique nas imagens e elas revelam-se-nos em toda a sua grandeza]
Arrumava papéis quando duas folhinhas me surpreendem. Era o texto que Francisco Miguel Duarte - Chico Miguel para os amigos - leu num almoço de homenagem, organizado pelos seus amigos, em janeiro de 1988, pelo seu 80º aniversário e 4 meses antes do seu inesperado falecimento. 
A sua intervenção deixa-nos entrever um pouco do que foi a sua vida e também o homem que ele era.
A seguir a Manuel Rodrigues da Silva o Chico Miguel foi o português que o fascismo manteve preso mais tempo. 21 anos e 2 meses. É também um campeão das fugas, a par de Jaime Serra,  com4 fugas das cadeias da ditadura. Uma em Janeiro de 1960 com Cunhal e mais oito companheiros e depois em Dezembro 1961, com mais 8 camaradas, numa fuga só imaginável em filme de aventuras, no carro blindado de Salazar que estava ao serviço da prisão de Caxias.
Chico Miguel estava por Paris quando insistentemente requereu à direção do PCP em regressar a Portugal clandestino para participar na organização que desde há alguns anos no meio de grandes dificuldades criadas por sucessivas prisões, organizava meios humanos e materiais para as ações armadas e que viria a ser a ARA.

A direção do PCP esteve muito relutante em aceder à pretensão de FM porque não o queria ver de novo na prisão e o risco não era pequeno. Assim, em 1968, Francisco Miguel frequenta um curso para as ações armadas, na União Soviética, com mais alguns voluntários. Era o segundo curso para o efeito pois o primeiro tinha sido o que eu e Rogério de Carvalho frequentámos em Cuba, de Janeiro a Abril de 1965.

Conhecera Francisco Miguel no inicio de Janeiro de 1965, em Moscovo, simultaneamente com Álvaro Cunhal quando vieram tomar o pequeno almoço comigo e Manuel Rodrigues da Silva, no "hotel do partido" (designação do hotel que acolhia os convidados estrangeiros do Partido Comunista da União Soviética).

Em Outubro de 1968 Francisco Miguel está em Portugal e, enquanto não arranja casa sua, está a viver comigo e a Maria Machado, cerca de mês e meio, num apartamento clandestino que alugáramos na Estrada dos Arneiros a Benfica, em Lisboa. Esse convívio diário permitiu um melhor conhecimento mútuo e fortalecer a nossa amizade. Falava-nos da sua vida de luta, do seu Alentejo, de Baleizão e de Serpa, discutíamos a politica e as ações armadas futuras que só viriam a ter lugar finalmente, após novos atrasos devidos a prisões, em Outubro de 1970, já com Jaime Serra na direção do Comando Central da ARA constituído por ele e nós os dois.

Francisco Miguel levantava-se muito cedo, entre as 6 e as 7 horas e quando nos levantávamos ele logo nos apresentava várias folhas com poesias que todos os dias escrevia sentado na cama, papel em cima de um livro, sobre os joelhos, em folhinhas A5. Ora poesia lírica e de amor (amores frustrados pela luta e desencontros reais na clandestinidade que sofreu e de que nos chegou a falar) ora de poesia revolucionária. Recordo-me de lhe dizer que me parecia  melhor conseguida a primeira do que a segunda. Depois participámos diretamente ou na sua direção, com Jaime Serra, nas ações armadas da ARA, entre Outubro de 1970 e Agosto de 1972. 
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