Foi uma decisão do CC reunido no passado dia 19 do corrente mês que, no entanto, decidiu não se vergar totalmente ante o império da "antidemocrática" lei dos partidos e resolveu que o CC eleito vote com o BRAÇO NO AR a comissãopolítica, o secretariado e o secretário-geral.
O CC do PCP considerou-se entre a espada e a parede e "aprovou" o voto secreto para a eleição do Comité Central como quem aprova veneno para a ementa da próxima ceia.
Melhor que esta imagem sobre a consternação, o furor, o frémito de revolta "democrática" que atingiu os 183 membros do CC do PCP, eleitos há quatro anos pelo simpático método do braço no ar, só a própria Resolução do CC. Com a vossa licença e sublinhados meus, dou a palavra ao CC do PCP:
"Resolução do CC sobre as leis dos partidos"
"As forças dominantes e os seus representantes políticos (PSD, CDS-PP, PS), com a colaboração do Presidente da República, aprovaram leis (Lei dos partidos e Lei sobre o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais) que são um ataque frontal a um dos aspectos essenciais da liberdade conquistada com o 25 de Abril.
..... Estas leis são uma aberração democrática, são inaceitáveis no quadro do regime democrático e o Partido deve na sua acção desenvolver um combate sistemático contra elas com o objectivo final da sua revogação... Os autores e responsáveis por estas leis, dirigidas contra o PCP, têm em vista, o enfraquecimento e destruição do Partido...
O Comité Central considera necessário o desenvolvimento de uma acção de combate a estas leis... Assim, o Comité Central considera e propõe ao XVII Congresso que: ... - as votações no Congresso sejam em geral de braço no ar; - a eleição do Comité Central ... seja feita por voto secreto. O Partido reserva a sua posição e atitude futura para com estas leis iníquas, antidemocráticas e inconstitucionais, ..."
Para que os militantes do partido não afrouxem a indignação e o combate ao voto secreto e a outras iniquidades daquelas leis o próprio regulamento quebra a boa prática de apenas regular para não descurar nem por um momento o necessário combate ideológico. Senão veja-se o ponto VI do regulamento:
VI
1. Cada delegado tem direito a um voto.
2. As votações são feitas de braço levantado.
3. A eleição do Comité Central, por disposição antidemocrática da lei dos partidos, contrária ao direito e à possibilidade que os delegados ao Congresso sempre tiveram de decidir democraticamente sobre o método de votação que entendem mais adequado, é feita por voto secreto.
4. As deliberações são tomadas por maioria dos delegados presentes no Congresso.
Indo lá atrás.
O Comité Central, em 1988, sob a direcção do autêntico Álvaro Cunhal abordou "cientificamente" o método das votações.
Álvaro Cunhal explicou que lá fora metade dos partidos comunistas elegiam o CC com o braço no ar e outros tantos, mais coisa menos coisa, com voto secreto. Revelou com superior "fair play" a um CC que bebia as suas palavras que uma solução ou outra solução cabia sem ofensa no centralismo-democrático do correcto marxismo-leninismo. Acrescentou, no entanto, como não quer a coisa, que também se pode ter em conta a tradição dos partidos.
Os 193 membros do CC, treinados como estavam, perceberam de imediato que uma coisa era igual à outra mas tendo em conta a tradição do PCP uma coisa era afinal mais igual que a outra. E assim o braço no ar foi, durante 12 interessantes meses, arma de arremesso da maioria fidelíssima do CC, que estava certa, contra a cabeça desnorteada de um grupo que com o andar dos meses e os solavancos do caminho foi diminuindo até se fixar em 5 teimosos. Que felizmente estavam errados.
Eleger órgãos directivos de um partido ou pessoas para qualquer cargo por voto secreto é uma forma que o senso comum considera mais democrática do que a de braço no ar porque evita naturais constrangimentos de quem vota e, eventualmente, represálias ou antipatias de quem foi eleito apesar do seu voto contrário.
Por isso dar notícia de que o voto vai ser secreto numa eleição poderia parecer tão insólito como, por exemplo, o Gabinte de um 1º Ministro desmentir com um comunicado a revelação na imprensa de que o chefe do Governo teria batido uma soneca numa sesta num tal dia entre uma sessão no Parlamento e outra num desfile de moda. Mas... o insólito acontece. Num e noutro caso. E, no caso do PCP, vários têm sido os jornais a dar destaque ao explosivo voto secreto.
O CC do PCP está numa fúria por se ver constrangido pela nova lei dos partidos. Ninguém gosta de ser condicionado para mais sobre uma norma interna que na opinião de muitos dos mais alinhados membros desse partido tem o aspecto de ilegítima intromissão.
Mas há mais duas razões para que o VOTO SECRETO abale e indigne a direcção do PCP.
Uma de menor importância estratégica mas mesmo assim de grande impacte psicológico é que o grupo dirigente do PCP vem desde 1988 travando um braço de ferro com os seus "críticos" e "renovadores".
O voto secreto foi assunto recorrente e obcecação nas seis reuniões do CC que, no ano de 1988, se ocuparam da preparação do 12º congresso do PCP, em Dezembro desse ano, no Porto. Com a União Soviética e o Muro de Berlim a abrirem fendas, o CC do PCP teve de arrostar e dar combate a uma fronda que incendiava as organizações e ateava nas suas próprias fileiras.
Eis os principais focos de incêndio:
em 1987/88 A 1990/91
O Grupo dos Seis - Vital Moreira , Álvaro Veiga de Oliveira, Victor Louro, Silva Graça, Fernando Marques, Dulce Martins e muitos outros como Zita Seabra, José Magalhães, Jorge Lemos, João Labescat, Delgado Martins, Ana Merelo;
A Terceira Via com José Saramago, Baptista Bastos, Mário de Carvalho, António Borges Coelho, Urbano Tavares Rodrigues, Joaquim Gomes Canotilho, António Hespanha, António Teodoro, Mário Vieira de Carvalho, José Barros Moura, Pina Moura, José Luís Judas, António Mendonça, José Ernesto Oliveira, Helena Neves, João Rodrigues, Victor Neto, Clara Boléo, Manuel Correia, João Galacho, Olga Areosa, Rogério Moreira, Mário Lino, José Garret, João Abel de Freitas, Fernando de Castro, Alfredo Cardoso, João Tunes, António Graça, Carlos Cidade, Raimundo Narciso.
O Grupo dos 24 de Almada com Francisco Simões, Ronaldo da Fonseca, Francisco Rocha e outros;
O Grupo da Marinha Grande com Osvaldo de Castro, Joaquim Carreira e outros.
E a partir de 2000
Os Renovadores com Carlos Brito, Luís Sá, Edgar Correia, João Amaral, João Semedo, Carlos Luís Figueira, Domingos Lopes, Paulo Fidalgo, Cipriano Justo, Elvira Nereu, Eufrásio Filipe, Helena Medina, Carreira Marques, Jorge Gouveia Monteiro, Henrique de Sousa, Paulo Sucena, Rogério de Brito, Vasco Paiva, Vidal Pinto, Viriato Jordão e muitos outros.
E a partir de 2000
Os Renovadores com Carlos Brito, Luís Sá, Edgar Correia, João Amaral, João Semedo, Carlos Luís Figueira, Domingos Lopes, Paulo Fidalgo, Cipriano Justo, Elvira Nereu, Eufrásio Filipe, Helena Medina, Carreira Marques, Jorge Gouveia Monteiro, Henrique de Sousa, Paulo Sucena, Rogério de Brito, Vasco Paiva, Vidal Pinto, Viriato Jordão e muitos outros.
A outra e essencial razão contr o voto secreto é a profunda descrença na bondade do método eleitoral quando este se aplica a um universo que não seja o restritíssimo "círculo dos entendidos". Só nesse caso o voto e a opinião é fundamentada. Subentende-se. O secretário-geral deve ser escolhido pelo núcleo duro do secretariado e da comissão política. O grupo restrito que domina e controla tudo o que é essencial. A proposta deverá ser então submetida à apreciação da comissão política e do secretariado. Este é o primeiro círculo decisivo para a escolha do secretário-geral quando o caso se ponha porque a tendência é para lugar vitalício. É também este círculo que deve fazer a lista do futuro secretariado, futura comissão política e futuro comité central.
A lista de nomes para o CC é apreciada e aprovada pelo CC cessante e depois submetida à discussão e votação dos delegados numa sessão especial do congresso, fechada para o efeito.
Neste processo o voto de braço no ar é fundamental. Pelos contactos, conversas, reuniões prévias com cada organismo e organização a que cada um dos felizes contemplados pertença foi criado uma predisposição, sempre determinantemente influenciada de cima para baixo, para a sua eleição. De modo que, mesmo por VOTO SECRETO, o risco em congresso não é grande para mais com delegados escolhidos a dedo. Por proposta de cima, em geral, e por votação de braço no ar.
O risco de uma votaçãop surpresa é menor ainda sabido como é fortíssimo no PCP o respeito pelas opiniões ("muito mais fundamentadas") vindas de cima. Mas princípios são princípios e o braço no ar é uma garantia para qualquer inesperada ou incontrolável surpresa. Além do que tudo o que seja menos de 90% dos votos é já do domínio do insuportável.
O CC eleito irá eleger ou mais propriamente ratificar, a proposta para o secretariado, a comissão política e coisa rara, para secretário-geral acordada pelo núcleo duro do partido.