2013/06/08

Na Bósnia em 1997

Em Julho de 1997 estive na Bósnia na qualidade de membro da Comissão Parlamentar de Defesa da Assembleia da República, no âmbito de uma delegação que se deslocou a este novo país resultante do desmembramento da Jugoslávia, para visitar as tropas portuguesas sediadas em Rogatitsa. Da delegação faziam parte Eduardo Pereira presidente da CPDefesa ((PS) , Marques Júnior (PS) já falecido), Acácio Barreiros (PS), João Amaral (PCP) também já falecido, Cardoso Ferreira (PSD) que se vêem de costas na primeira e eu próprio que tirei a fotografia, na qual se vê ainda o coronel Carmelino Mesquita que comandava a força portuguesa e o embaixador português em Sarajevo. Ao fundo vê-se o helicóptero que nos transportou entre Sarajevo e Rogatitsa.
A força militar portuguesa fazia parte da EUFOR e estava em "missão de paz" na Bósnia na sequência da guerra fratricida que levou ao desmembramento da antiga Federação da Jugoslávia e que teve lugar entre 1991 e 1995.
Na foto em que estou com Marques Júnior vê-se, ao fundo, Sarajevo, capital da Bósnia Herzegovina, que sofreu grandes bombardeamento durante a guerra que opôs a população sérvia e a população bósnia maioritária. Recordo-me de ter  inadvertidamente pregado um susto ao embaixador quando saí da estrada e entrei pelo campo para tirar umas fotos. Gritou-me, "não se mexa e volte pelo mesmo caminho, os terrenos ainda estão cheios de minas".
Em Rogatitsa procurei saber se o que me contavam os militares portugueses teria fundamento: que eram bem vistos e bem tratados pela população local que na Bósnia se manifestava particularmente contra a tropa de alguns países aí presentes pelo seu comportamento arrogante para com os locais. Pareceu-me que a informação tinha fundamento. Quando declinávamos a nacionalidade numa curta volta pela povoação éramos manifestamente bem recebidos. Alguns militares portugueses dando fé à legenda da nossa propensão para a miscigenação já tinham, aliás, planos ou promessas de casamento com moças locais.
(Nota: um clique nas fotos amplia-as)


2013/06/06

402 estudantes pedem a demissão de Salazar, em 1959.

José Bernardino, meu colega do IST foi quem me veio pedir a assinatura, em 1959, para o abaixo-assinado  que a seguir reproduzo. Assinar um documento destes era então um risco sério à liberdade e ao futuro profissional. Mas o fascismo se metia medo também criava uma intolerável indignação e tornava corajosas pessoas comuns. 
Conheci o José Bernardino na Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico era já ele um quadro experimentado e carismático do movimento estudantil. Vivia na Av de Roma com os irmãos. As tertúlias em sua casa levavam-me a imaginar o que seria uma sede do PC. O mais velho era o Davide outro quadro político de envergadura. Viria a ser morto, em Angola, pela UNITA, quando exercia medicina, no Huambo, sua terra natal. O Zé foi também meu colega de tropa, a partir de Agosto de 1959, uns meses depois deste abaixo-assinado. Foi ele que me recrutou para o PCP, em Vendas Novas, na Escola Prática de Artilharia, onde iniciámos o Serviço Militar Obrigatório como cadetes. Depois fomos colocados, em Janeiro de 1960, mais o Ernâni Pinto Basto e o José Almada Negreiros, já como oficiais milicianos, no GACA-2, em Torres Novas. O José Bernardino passou a viver na clandestinidade, como "funcionário" do PCP a partir de 1961. Foi preso logo em 1962, no âmbito de grandes lutas estudantis, tendo saído em liberdade só em 1969. Voltou à clandestinidade pouco depois da libertação. Foi membro do CC do PCP, foi casado com Manuela Bernardino de quem teve duas filhas. Faleceu em 1996, com apenas 62 anos. Link. Ernâni Pinto Basto foi professor de Matemática e ficou celebrizado, nomeadamente, na foto que deu origem a um não menos célebre livro "A FOTO" como se explica aqui. José Almada Negreiros filho do grande Almada, era arquiteto e também um excelente camarada (camarada era e é o tratamento usual nas Forças Armadas). Depois do 25 de Abril reencontrámo-nos para jantar e festejar o fim da ditadura, ele, eu e o Ernâni. Nós levávamos uns carritos vulgares e ele com um Porsche achou conveniente desculpar-se:"É que eu não posso andar a mudar de carro todos os anos!". 
 




2013/06/02

A ARA contra a Guerra Colonial e o Fascismo

- Aluga aí um apartamento mobilado, rapidamente. Tens dois dias - disse-lhe eu para o apressar e dei-lhe uma zona larga de Lisboa para procurar.

- Eh pá, então alugas-me um apartamento clandestino assim, num prédio destes, no meio da avenida dos EUA com a Av de Roma?... - repreendia eu o Martins que era um camarada completamente "limpo" e que ficaria de quarentena, sem qualquer actividade política, enquanto precisássemos da casa.

- Olha olha!... queres melhor? Num sítio chique, assim, é que a PIDE não desconfia.
Na realidade não conhecia ninguém que vivesse perto do local e como a urgência era máxima,  conformei-me.

O apartamento iria servir de refúgio para o Ângelo de Sousa quando fugisse da Base Aérea 3, em Tancos, após a sabotagem dos aviões e helicópteros e serviria ainda para os últimos preparativos da sabotagem, nomeadamente a simulação da colocação das cargas explosivas e incendiárias nos aviões e helicópteros, ligações da complexa rede elétrica, tudo isto às escuras ou com um fiozinho de luz de minúsculas lanternas. A simulação foi exercitada até a lição ficar sabida de cor e salteada pelo Carlos Coutinho e o Ângelo de Sousa. O António Eusébio também ajudava à festa mas o papel dele era ficar de fora do hangar a vigiar a entrada.

Correu tudo muito bem. Exceto o susto que apanhei mas felizmente só 4 anos depois, em 1975, já a revolução andava à solta pela rua, quando soube que no andar de cima do nosso quartel-general morava um familiar meu. Era de todo inconveniente que por acaso ou azar me visse por ali. Meter familiares ou amigos nestes assuntos era de todo, mas de todo mesmo, inconveniente a menos que programado.
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Na imagem: Nota da PIDE publicada nos jornais e na TV, na expectativa de que alguém a ajudasse a encontrar o Ângelo. Não encontrou. O Ângelo foi a salto para o estrangeiro e algum tempo depois voltou para a clandestinidade, para lutar na ARA, com a Fernanda, sua namorada à data dos factos. Tiveram três lindas filhas, hoje umas senhoras. 
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Os nomes citados são verdadeiros excepto o de "Martins" que é pseudónimo. A verdadeira identidade nunca foi revelada por razões familiares porque era uma pessoa muito próxima de um ministro de Marcelo Caetano.