2013/12/26

Pieter Bruegel - O Velho e os Provérbios Flamengos

Os Provérbios Flamengos ou Os Provérbios Holandeses (óleo sobre madeira 117 x 163 cm) é uma obra magistral do grande mestre flamengo Pieter Bruegel O Velho (1525 - 1569) pintada em 1559.

Nesta obra o pintor ilustra mais de 100 provérbios holandeses. O número varia conforme os estudiosos porque a mesma cena pode representar mais do que um provérbio. As imagens que se seguem à do quadro identificam cada um deles, no total de 118, de acordo com os estudos e obra de Rose-Marie e Rainer Hagen.
Pieter Bruegel tinha 40 anos quando entrou em Bruxelas o Duque d'Alba, o maior e mais temido comandante dos exércitos de Filipe II de Espanha, encarregado de espalhar o terror por onde passava. Muitos foram os massacres levados a cabo pelas tropas espanholas nos Países Baixos, uma das muitas possessões de Filipe II, da Casa de Habsburgo, para submeter e converter pela força os protestantes à religião católica. Pieter Bruegel viveu esses tempos de perigo e repressão em que foram assassinadas mais de uma centena de milhar de pessoas nos Países Baixos . Há quem não tenha dúvidas em interpretar muitas das suas obras como testemunhos de identificação com a rebelião anti-filipina ainda que nunca de forma explícita pois isso custar-lhe-ia a vida. 
 
 
 
 


2013/12/23

El Prado nas Janelas Verdes, em Lisboa

"A Paisagem Nórdica do Museu do Prado" é o nome da exposição patente ao público de 3 de Dezembro de 2013 a 30 de Março de 2014, no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa que traz 57 pinturas dos grandes mestre do séc. XVII,  Rubens, Brueghel- O Novo, Lorrain pertencentes a um dos melhores museus do mundo, El Prado, de Madrid. É uma oportunidade a não perder pelos amantes das artes plásticas.

 http://youtu.be/GXpJy27VtOw  Bilhetes e informações em: http://www.pradoemlisboa.pt/

Entre as obras que nos "visitam" estão quadros célebres tão preciosos como:
Paisagem Alpina, de Tobias Verhaecht;
A vida no Campo, A Abundância e os Quatro Elementos e Boda Campestre de Jan Brueghel o Velho;
A Visão de Santo Huberto, pintada em colaboração com Peter Paul Rubens;
Paisagem com Ciganos e Tiro ao Arco, de David Teniers;
Cerco de Aire-sur-la-Lys, de Peeter Snayers;
Bosque, de Simon de Vlieger.
Tenha-se em conta que Brueghel é o apelido de uma família de grandes mestres pintores flamengos. Pieter Brughel é o avô (1525? - 1569), o maior, na minha opinião e que leva a designação de o Velho para não se confundir com outro grande pintor, o seu filho mais velho com o mesmo nome e a que se costuma designar por Pieter Brueghel o Novo ou o Jovem (1564-1636). O segundo filho chama-se Jan Brueghel, no entanto, como o filho deste, também pintor, tem nome igual ao seu o pai é designado por Jan Brueghel o Velho e o filho por Jan Brueghel o Novo ou o Jovem que é, portanto, neto de Pieter Brueghel o Velho.
Junto algumas imagens dos quadros em exposição no MNAA. Tenha-se em conta que as cores não são muito fiéis aos originais e em pintura a cor é fundamental. Algumas imagens não cobrem totalmente a pintura cortando ligeiramente as suas margens. Servem para dar uma ideia da grande beleza destas obras de arte.
 
"Visão de Stº Huberto" (1617-20) óleo s/ madeira 63cm x 100cm de Rubens e Jan Brueghel o Velho


Boda campestre (1621-23) Jan Brugel - O Velho

"Paisagem de neve com armadilhas para pássaros" (1601) de Pieter Brueghel o Jovem (é uma obra que reproduz a pintura com o mesmo nome da do seu pai pintada em 1565)

2013/10/14

São cortes"condições de recurso" stupid

No elevador os vizinhos do sétimo:
- Olá bom dia!
- Bom dia, como vai?
E continuaram muito concentrados numa conversa entaramelada sobre as condições de recurso que não deu para entender.

Eram umas 10 da manhã, ia naquele estado de espírito semimatinal, disposto a encarar o mundo de um ângulo mais favorável. Já na rua, fiz uma festa ao cão da vizinha, que anda sempre sem açaimo. 
- Olá viva! Ai o Luizinho, está um amor, já tão crescidinho! e fiz-lhe um afago na cabeça que ele sacudiu, reprovador.
- Então e as "condições de recurso" - atirou-me, à laia de bom dia, a mãe, a D. Amélia, que se virou logo para o Sr. Martins, a continuar a conversa, pródiga em ademanes  que eu até penso que ali há coisa.
 Ia tomar a bica e ler o jornal numa atitude de bom-serás, disposto mesmo a cumprimentar a madame Lantejoulas, brilhos que lhe sobem dos sapatos cravejados de vidrilhos até ao cabelo emplumado quando, mal nada, um enorme sururu. A Micas corria na dianteira, e vociferava “as condições de recurso”, “as condições de recurso”, o casal bem-posto ia-lhe na peugada, passo estugado mas sem se descompor, atrás, muito vermelho ia o Mestre Arraial braços ao ar, gesto largo gritava que se ouvia no Campo Grande, agarra! agarra! Ele que é todo trititi trititi trititi a tudo que é criança ou mesmo bebé para meter conversa com os adultos, bravejada "as comissões de recurso", "as comissões de recurso". Pelas laterais, já sobre o canteiro das flores espinoteava a miudagem e juntavam-se à festa entre risadas e marotices “as condições de recu” as “condições de recu”.
- Que se passa, que se passa? - interrogava eu.
- Então não está a ver? São as "condições de recurso", anda aqui, fugida, uma "condição de recurso"
- Mas… mas… não deu para mais já lá iam, rabo alçado, relvado a dentro. 

Já me sentava com o meu vizinho, fiz sinal, queixo esticado para a Tânia, atrás do balcão: é a bica do costume quando o Sr. Lacerda se vira para mim
- Então não quer hoje antes uma "condição de recurso"? - Ao meu espanto e antes que lhe perguntasse de que estava a falar ele adiantou-se
- Já vejo que não viu o vígaro do Portas na conferência de imprensa a anunciar os cortes nas pensões de sobrevivência.
-Vi, assim de raspão que não aguento "banha da cobra". Mas não o ouvi falar em cortes.
- Pois é isso. Ele trocou-lhe o nome!
-Como assim?
- Chamou-lhes “condições de recurso”. Aos cortes. O vigarista vai aplicar uma “condição de recurso” ao pessoal da função pública e a gente que se lixe.
- Ahhh!!... esse trafulha... agora tou a perceber…  

2013/08/24

Índios da Meia Praia

Da tertúlia do NAM, acerca dos Índios da Meia Praia, falei no penúltimo post. Agora documento a notícia com fotos que hoje tirei, do bairro dos pescadores da Meia Praia, em Lagos, celebrizado com aquele nome de Índios da Meia Praia.
Vinha já de regresso quando me cruzei com uma senhora com aspecto local que interpelei, então o bairro já tem minimercado e café! É o bairro dos pescadores, não é? Evitei a designação de "Índios da Meia Praia" receando que pudesse não ser do agrado dos residentes. A senhora respondeu-me sorridente: é sim senhor é o bairro dos Índios da Meia Praia. Falei-lhe então da tertúlia do NAM e do arquiteto José Veloso e da Luísa Corte Real de que falo no post acima referido. Ah o Sr. Zé Veloso, o arquiteto! Ele é que foi o herói desses feitos. E informou-me eu sou a dona do café e o meu marido é o que aparece a cantar o fado no filme [de Cunha Teles] sobre os Indios da Meia Praia.
 
Sem suspeitar interpelava uma excelente testemunha. Só um pouco à frente me ocorreu que "lhe devia ter perguntado o nome, para personalizar o post que logo vou colocar no Memórias" e que é este que aqui fica mas sem o nome de tão inesperada testemunha dos factos.
(Um clique amplia as imagens. Reparar nas caixas de correio de todo o bairro na 6ª imagem à esquerda do minimercado)

 
 

 


2013/07/17

Fugiu para o mais longínquo rincão da Pátria

Procurado por todo o palácio não o encontraram. Só à saída o porteiro explicou: foi para o deserto ou para a selva, uma coisa assim. O porteiro não tem obrigação de dominar inteiramente a geografia e não conhecer as Ilhas Selvagens, o extremo Sul de Portugal, para lá da Madeira, encostadas às espanholas Ilhas Canárias já bem metidas por África adentro.
 
Portugal, após a tentativa de suícidio do governo que o deixou mal morto, atravessa a mais grave crise política dos últimos 40 anos que veio ampliar a já insuportável crise social e económica e o PR que devia estar em Belém, com as mãos bem firmes nos comandos do barco que o governo abandonou, fugiu. Fugiu para o mais longínquo rincão de Portugal habitado apenas pelas cagarras que pelo menos até à chegada de Cavaco Silva nunca "grandolaram", que se saiba, nenhum governante necessitado.
 
- Cagarras?
- São umas gaivotas grandes que se passeiam por meio mundo, mar e terra, todo o Atlântico e todo o continente americano. Desde os confins do Estreito de Magalhães, no extremo Sul, até à América do Norte. Mas, sem nunca perderem o Norte, voltam sempre, fiéis e certinhas, à Selvagem Grande, uma espécie de Maternidade Alfredo da Costa,  para nidificar.
 
Oferece-vos umas fotos que tirei quando lá estive, em julho de 1997, na visita de uma delegação da Comissão Parlamentar de Defesa. Saímos à noite do Funchal para uma fragada da Marinha portuguesa onde dormimos e ao raiar do dia chegámos às Sevagens. As ilhas não têm porto ou mar fundo que permita a aproximação de uma fragata de modo que por uma escada de corda descemos do convés até um bote que nos levou à Selvagem Grande. Visitámos a ilha e observámos as cagarras nos seus ninhos entre rochas. Não nos receberam bem. Ou grasnavam forte e feio ou punham um olhar reprovador em que se lia: mas que pouca vergonha é esta de virem aqui violar a nossa intimidade. Não percebem que isto é Selvagem!
 
No passado de fome da Ilha da Madeira, nos tempos da ditadura, alguns madeirenses iam ali caçar cagarras. Depois, aproveitando o 25 de Abril, as cagarras conseguiram que as ilhas fossem reconhecidas como reserva natural com direito a um vigilante e especialistas estudiosos da biodiversividade.
Os espanhóis ainda hoje teimam em chamar rochedos às ilhas porque como rochedos a delimitação de fronteira marítima das Selvagens deixaria de ser a meio caminho das Canárias e encolheria muitas milhas. Promovidas a ilhas ajudam a que Portugal possua a ZEE maior da UE com 1,6 milhões de Km2 cerca de 16 vezes a dimensão de Portugal. (Clique na imagem para a ampliar)
 
Selvagem Grande                           Fragata e bote para a ilha
 
Cagarra no ninho                             Cagarra no ninho

 
Deputados da Comissão de DN

2013/07/09

Tertúlia do NAM Índios da Meia Praia na Casa da Achada

Foto de Inês Castro

Da direção do NAM e meu vizinho, o João Caixinhas achou bem dar-me boleia a mim e à Maria. Chegados à Rua da Madalena labirintou por aí acima até encontrar um passeio suficientemente próximo da Casa da Achada para estacionar.
Ao entrar encontrei amigos que há anos não via. Esperavam-nos os Índios da Meia Praia que o Movimento Não Apaguem a Memória – NAM , levava ao Centro Mário Dionísio na Casa da Achada. Mouraria, escadinhas, becos, vielas, larguinhos, casas de muitas cores, lisboetas embasbacados a olhar para as janelas, para as flores, para as mulheres velhas nas varandas e para as mulheres novas na rua a orientarem o trânsito da miudagem em correria desaustinada. Aturdido com Lisboa tão castiça, lusitana, fenícia, cartaginesa, ateniense, romana, mourisca, visigoda, entrei. Mesmo à saída, a estender-me a mão, o Rui Mário, que não é por ser meu amigo desde Ciências na Rua da Escola Politécnica que o considero o maior crítico de artes plásticas deste desorientado país e logo a seguir, com a irmã, o João Andrade Santos que há mais tempo ainda não via. Olhei e a toda a volta o espaço interior se iluminava com uma rara exposição de três dezenas de belíssimos quadros do pintor e matemático José Júlio (Andrade Santos). Percebi então que a presença de Rui Mário, assim como dos filhos do pintor se devia à exposição e a visita guiada que antecedera na programação da Casa os nossos Indios da Meia Praia .
Logo logo ali à frente o arquiteto José Veloso. O Zé Veloso, o pai verdadeiro do SAAL dos Índios da Meia Praia dei-lhe um abraço e cumprimentei a seguir Eduarda Dionísio, anfitriã de todos nós que jubilosamente nos recebia. Estava eu nesta festa de reencontros e logo a Clara Boléu – há que anos…- me dava uns papelinhos com a programação "a não perder" da Casa da Achada. E ao lado o João Rodrigues com o Pedro, filho de ambos que ainda há pouco tinha 4 anos e agora estava ali com trinta e tal e uma barba preta que antes não tinha e que depois de José Veloso nos apresentar os seus Índios da Meia Praia, dirigiu o coro da Casa para nosso regalo. Olho e vejo a Judite! - Vais para Lagos este ano? Ainda não sei. Ah e quem é esta linda miúda? Tua neta? A Laura tem 17 anos. Olha este Senhor (este Senhor era eu) era um amigo do avô. Foi há tanto tempo... Há tantos nos já que o Zé Monteiro morreu e ali mesmo ao lado a confirmar tudo o Ernâni Pinto Basto.
Com que então uma Casa cheia de amigos! Não é desses que estou a falar. Era agora de amigos do Facebook ! Estavam os amigos da direção do NAM e associados que aproveitam e vêm
como a minha amiga Luísa Corte Real que é de Lagos e quase de certeza foi ela que se lembrou de trazer os Índios à Casa da Achada como iniciativa do Movimento,
como a minha amiga Luísa Tiago de Oliveira, conheces ali aquele? É o Ernâni, filho do Ludgero Pinto Bastos que foi do CC e companheiro de Cunhal naqueles tempos de 40 de que já ninguém se lembra. Eu a explicar e ela a acrescentar isto e aquilo porque é historiadora e afinal sabia tudo a respeito do Pinto Basto. Com estas credenciais resolvi mesmo apresentar-lhe o filho e para ali ficaram a falar, enquanto eu me virei com a Maria Machado a conversar com a Manuela Almeida que desta vez não veio à tertúlia com o Tó. Mais à frente a Maria Manuel e o marido, o Daniel Ricardo que eu responsabilizo por a revista Visão andar tão boa, já se acomodavam para o início da sessão. Na outra ponta estava a Inês Castro que nos havia de presentear no Facebook com fotografias que comprovam tudo o que digo e ainda um filme para maior glória da Casa e do Coro da Achada.
A Helena Pato, presidente da direção do NAM já com todos quase sentados disse que havia horários a cumprir e que estava ali o arquiteto José Veloso que veio de Lagos para nos contar a história mítica dos Índios da Meia Praia e da iniciativa do SAAL que deu casa a quem nunca sonhara com tal exagero.
O meu amigo Zé Veloso disse logo que não eram índios mas pescadores muito pobres que arrimaram ali a pouco e pouco, já perfaziam umas dezenas de famílias e que escondidas atrás das dunas pescavam conforme podiam com umas redes pobres como eles e começaram a fazer as suas casas primeiro com umas redes velhas da pesca mas que por serem redes chovia em casa. Juntaram então folhas, restos de coisas perdidas e fizeram umas barraquinhas de colmo que afastava a chuva e onde cabiam com a mulher e os filhos. Nem Lagos sabia deles nem eles sabiam de Lagos.
Foi então que aconteceu em 1974 aquela espécie de golpe militar que afinal era Movimento e depois virou revolução ainda que interrompida e abriu as portas à Liberdade.
Foi então que aconteceu... e o Zé Veloso que era arquiteto e agora em Julho de 1974, com a revolução a querer começar decidiu que não havia direito que os Índios que afinal eram pescadores continuassem assim a ser índios e a viver como quem não vivia nuns buracos que eram choças.
Foi o princípio do SAAL ali em Lagos. O arquiteto José Veloso foi à Meia Praia que fica meia encosta abaixo da sua bela casa e começou a falar-lhes. Que agora com o 25 de Abril de 1974 já podiam ser pessoas. Hum... eles desconfiaram e até lhes pareceu ser perigoso começarem agora assim, sem mais, também a ser pessoas como as outras. Não foi fácil. Mas quando o arquiteto José Veloso disse que havia dinheiro do ministério, onde estava o Nuno Portas, para as casas deles pareceu-lhes que a conversa começava a desconversar, podia lá ser! alguns até se assustaram. Que não. Tinham vivido até ali portanto era melhor que se esquecessem que existiam. Visitas foram só da GNR e era melhor não terem visitas.
Mas… e isso foi a sorte dos pescadores… havia mulheres. Além dos pescadores havia as mulheres dos pescadores e as filhas dos pescadores que ao contrário dos maridos e dos pais embarcadiços tinham os pés bem assentes em terra firme. E foram as mulheres que, como diria o meu vizinho que é comentarista de TV, viram no arquiteto José Veloso uma "janela de oportunidades". Porque torna e porque deixa o Zé Veloso explicou tudo bem e elas acreditaram nele. Criaram uma associação e concertarem tudo como deve ser.
 “Ansiosa por deixar as barracas, a população organizou-se em turnos. Quando os homens estavam no mar, eram as mulheres que trabalhavam nas obras. Havia duas regras: as habitações tinham de começar a ser construídas ao mesmo tempo e todos teriam de ajudar na construção de todas as casas.”
       arquitetos e pedreiros orientaram os trabalhos, velhos e velhas, novos e novas, todos levavam de braçado ou à cabeça o seu tijolo, o seu balde de massa. Foi uma festa. Parecia impossível. Como pôde acontecer uma coisa assim darem casa a índios que eram pescadores pobres a ponto de ficarem gente, mesmo gente, como toda a gente.
Depois do arquiteto José Veloso que até se emocionou a reviver toda aquela saga marítima falou o sociólogo João Baía que nos revelou outras iniciativas pelo país nomeadamente em Coimbra.
 
Cansados de tanto mar, tantas dunas, tanta solidariedade, tanto 25 de Abril, fomos jantar num tasco do bairro. Não se via o mar porque escolhemos preços baixos mas comemos umas excelentes sardinhas assadas, gordas da época, como deve ser.
Regressámos à Casa da Achada para ver o filme do Cunha Teles Os Índios da Meia Praia com a canção do mesmo nome do Zeca Afonso. O José Veloso pediu-lhe a música para o filme e o Zeca foi logo ali, sentado ao seu lado, na mesa do café, a rabiscar a rabiscar e mal nada diz-lhe toma. Está aqui. E estava. E é linda a canção, a letra e a música do Zeca. Que pena ele não poder estar aqui a ver-nos extasiados a olhar para as imagens das dunas, dos pescadores, dos barcos, do mar a ir e a vir e ele a dizer, e ele a cantar:
 
      Aldeia da Meia Praia                         De Montegordo vieram                                 
Ali mesmo ao pé de Lagos                  Alguns por seu próprio pé                      
Vou fazer-te uma cantiga                  Um chegou de bicicleta                          
         Da melhor que sei e faço                       Outro foi de marcha à ré                                    

Tu trabalhas todo o ano                     Quem dera que a gente tenha                   
Na lota deixam-te nudo                         De Agostinho a valentia                        
Chupam-te até ao tutano                        Para alimentar a sanha                          
Levam-te o couro cabeludo                    De enganar a burguesia                           


…….............  
 
(Video com a canção e a letra aqui )

Os Índios da Meia Praia



Aldeia da Meia Praia
Ali mesmo ao pé de Lagos
Vou fazer-te uma cantiga
Da melhor que sei e faço

De Montegordo vieram
Alguns por seu próprio pé
Um chegou de bicicleta
Outro foi de marcha à ré

Quando os teus olhos tropeçam
No voo de uma gaivota
Em vez de peixe vê peças de oiro
Caindo na lota

Quem aqui vier morar
Não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra
Se constrói uma cabana

Tu trabalhas todo o ano
Na lota deixam-te nudo
Chupam-te até ao tutano
Levam-te o couro cabeludo

Quem dera que a gente tenha
De Agostinho a valentia
Para alimentar a sanha
De enganar a burguesia
.........
Letra completa aqui link

2013/06/28

Os Jacarandás este ano chegaram mais tarde. Mas eles andam por aí.





Acho muito estranhas aquelas florzinhas azuis, dos jacarandás que habitam a minha rua. O tamanho não se avantaja ao da falangeta do meu indicador. Frágeis, vestidas com aquele veuzinho azul, seda? cetim? guardam lá dentro, o gineceu e o androceu. Mercê dos dons da Natureza, ou de Allá, se seguirem as regras de mafona, fecundarão e transformarão um migalhinho de gente nestes surpreendentes, enormes rapagões, os bugalhos que ali vemos.
Acho muito esquisito. Pintinha minúscula, discretamente cresce, cresce, engrossa, engrossa, faz-se casca grossa, rija que nem carvalhiça.  Primeiro fechada que não há diabo que a abra. Só o calor a pouco e pouco a demove. Então, reticente ainda, lá vai abrindo aquela bocarra e mostra aladas de fina membrana, sementes prontas a voarem para longe com o vento. 
Mas por mais explicação que a Deolinda que é minha vizinha, amiga e bióloga, me dê, garantindo que tudo se passa de acordo com a Natureza, acho muito estranho. E acho muito estranho porque as árvores são minhas vizinhas e andam por ali todo o ano comigo, ainda que apenas no seu espaço vital  e nunca vi essa transformação bizarra de frágeis e bonitas florinhas nestes tropeços feios e grossos que ora se pavoneiam lá ao alto ora, com a chuva, no inverno, se estatelam estrondosos na calçada dos passeios e ali ficam prostrados até que a limpeza camarária ou algum vizinho se compadeça da sua pouca sorte.
Mas estes jacarandás não me voltarão a surpreender. Hei-de espreitá-los e ver com estes que a terra há-de comer como é que flores tão sensíveis e de azul tão etéreo se transformam em cascos duros de ungulígrado e cor oposta. Será pela calada da noite? Será nos dias chuvosos de inverno em que não olho para o alto, para os braços nus das árvores despidas? Vou estar atento e a olhar todas as noites, porque estou certo que é pela calada da noite que elas pregam a partida.e vou surpreender o dom maternal da fecundidade.

2013/06/25

Jacarandás

O calor chegou muito tarde este ano e os Jacarandás, que outrora trouxemos do Brasil, caravelas Atlântico acima, estão tristes. Só agora dão um ar de sua graça.  Até a folhagem mingua. 
Surpreendentes, as suas sementes velhas, da floração anterior, exibem.se lá no alto, em confraternização inter-geracional. Das muitas que caíram e antes que os homens da limpeza camarária as levassem recolhi umas, aqui em baixo, para vosso estudo. [clique p ampliar]
 

 

Crivelli, Grão Vasco, Pieter Brugel o Velho e Hieronymus Bosch

1. Crivelli                                           2 Crivelli
________________________
 
3 Grão Vasco                          4 Grão Vasco 
 _________________
 
5. Pieter Brugel                                   6. Pieter Brugel 

__________________________
 
  7. Hieronymus Bosch
 
 
 
Carlo Crivelli (n. 1435, Veneza). Pintou a maior parte das suas obras em Ascona e Ascoli. Técnica: têmpora. Não pintou a óleo. Temas religiosos resultado das encomendas quase exclusivamente de ordens religiosas.
1. "A Virgem com o Menino, Santo Emídio, São Sebastião, São Roque, São Francisco de Assis e o Beato Tiago da Marca" (1487). Quadro cuja saída de Portugal (venda autorizada em 2013, pelo o Sec Estado José Manuel Viegas envolvida em polémica)
2. "A Virgem com o Menino  no trono" c. apresentação das chaves a S. Pedro (1988, Madeira 191x196cm) Staatliche Museen Berlim.

Vasco Fernandes (Viseu 1474 - 1542) mais conhecido por Grão Vasco o maior pintor português do séc XVI.
3. "Pentecostes". Portaria do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, 1534-35, assinada Velasco
4. "S.Pedro" (Pintado para a Sé de Viseu e atualmente no museu Grão Vasco em Viseu) é a obra mais conhecida de Vasco Fernandes que executou o grande retábulo da capela-mor da Sé de Viseu de 1501 e 1506..

Pieter Brueghel, "O Velho" (Breda, 1525- Bruxelas 1569) é talvez o mais célebre pintor flamengo do sec XVI.
5. "Parábola dos cegos guiando cegos" (1568) (parábola Evangelhos Mateus 15.14) 
6. "O Triunfo da Morte", 1562, óleo sobre tela, 117x162 cm. Museu do Prado Madrid.
 
Hierónymus Bosch ( 1450 - 1516), pintor e gravador Holandês dos séculos XV e XVI.
7. "As Tentações de Santo Antão" é um tríptico do pintor holandês Hieronymus Bosch que terá sido pintado entre 1495 e 1500. Está em Lisboa no Museu Nacional de Arte Antiga.

2013/06/08

Na Bósnia em 1997

Em Julho de 1997 estive na Bósnia na qualidade de membro da Comissão Parlamentar de Defesa da Assembleia da República, no âmbito de uma delegação que se deslocou a este novo país resultante do desmembramento da Jugoslávia, para visitar as tropas portuguesas sediadas em Rogatitsa. Da delegação faziam parte Eduardo Pereira presidente da CPDefesa ((PS) , Marques Júnior (PS) já falecido), Acácio Barreiros (PS), João Amaral (PCP) também já falecido, Cardoso Ferreira (PSD) que se vêem de costas na primeira e eu próprio que tirei a fotografia, na qual se vê ainda o coronel Carmelino Mesquita que comandava a força portuguesa e o embaixador português em Sarajevo. Ao fundo vê-se o helicóptero que nos transportou entre Sarajevo e Rogatitsa.
A força militar portuguesa fazia parte da EUFOR e estava em "missão de paz" na Bósnia na sequência da guerra fratricida que levou ao desmembramento da antiga Federação da Jugoslávia e que teve lugar entre 1991 e 1995.
Na foto em que estou com Marques Júnior vê-se, ao fundo, Sarajevo, capital da Bósnia Herzegovina, que sofreu grandes bombardeamento durante a guerra que opôs a população sérvia e a população bósnia maioritária. Recordo-me de ter  inadvertidamente pregado um susto ao embaixador quando saí da estrada e entrei pelo campo para tirar umas fotos. Gritou-me, "não se mexa e volte pelo mesmo caminho, os terrenos ainda estão cheios de minas".
Em Rogatitsa procurei saber se o que me contavam os militares portugueses teria fundamento: que eram bem vistos e bem tratados pela população local que na Bósnia se manifestava particularmente contra a tropa de alguns países aí presentes pelo seu comportamento arrogante para com os locais. Pareceu-me que a informação tinha fundamento. Quando declinávamos a nacionalidade numa curta volta pela povoação éramos manifestamente bem recebidos. Alguns militares portugueses dando fé à legenda da nossa propensão para a miscigenação já tinham, aliás, planos ou promessas de casamento com moças locais.
(Nota: um clique nas fotos amplia-as)


2013/06/06

402 estudantes pedem a demissão de Salazar, em 1959.

José Bernardino, meu colega do IST foi quem me veio pedir a assinatura, em 1959, para o abaixo-assinado  que a seguir reproduzo. Assinar um documento destes era então um risco sério à liberdade e ao futuro profissional. Mas o fascismo se metia medo também criava uma intolerável indignação e tornava corajosas pessoas comuns. 
Conheci o José Bernardino na Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico era já ele um quadro experimentado e carismático do movimento estudantil. Vivia na Av de Roma com os irmãos. As tertúlias em sua casa levavam-me a imaginar o que seria uma sede do PC. O mais velho era o Davide outro quadro político de envergadura. Viria a ser morto, em Angola, pela UNITA, quando exercia medicina, no Huambo, sua terra natal. O Zé foi também meu colega de tropa, a partir de Agosto de 1959, uns meses depois deste abaixo-assinado. Foi ele que me recrutou para o PCP, em Vendas Novas, na Escola Prática de Artilharia, onde iniciámos o Serviço Militar Obrigatório como cadetes. Depois fomos colocados, em Janeiro de 1960, mais o Ernâni Pinto Basto e o José Almada Negreiros, já como oficiais milicianos, no GACA-2, em Torres Novas. O José Bernardino passou a viver na clandestinidade, como "funcionário" do PCP a partir de 1961. Foi preso logo em 1962, no âmbito de grandes lutas estudantis, tendo saído em liberdade só em 1969. Voltou à clandestinidade pouco depois da libertação. Foi membro do CC do PCP, foi casado com Manuela Bernardino de quem teve duas filhas. Faleceu em 1996, com apenas 62 anos. Link. Ernâni Pinto Basto foi professor de Matemática e ficou celebrizado, nomeadamente, na foto que deu origem a um não menos célebre livro "A FOTO" como se explica aqui. José Almada Negreiros filho do grande Almada, era arquiteto e também um excelente camarada (camarada era e é o tratamento usual nas Forças Armadas). Depois do 25 de Abril reencontrámo-nos para jantar e festejar o fim da ditadura, ele, eu e o Ernâni. Nós levávamos uns carritos vulgares e ele com um Porsche achou conveniente desculpar-se:"É que eu não posso andar a mudar de carro todos os anos!".