Maria Gomes
é de Castelo Branco, tem duas filhas e dois filhos do primeiro casamento com
António Rodrigues. Após ter enviuvado casou com Fernão Martins de quem não teve
filhos.
É filha de
Alonso Gomes, mercador, natural de Arronches e de Helena Fernandes natural de
Castelo Branco.
Maria Gomes
está presa há dois anos, período que durou os interrogatórios e o julgamento.
Convoquem
todos os vossos “amigos” pelo Facebook para a cerimónia piedosa que decorre no
próximo domingo, em Lisboa, a seguir à Santa Missa, no Largo da Ribeira Velha
onde será erguida a fogueira e, após o sermão do padre Manuel Rebelo, queimada
viva Maria Gomes, para salvação da sua e das nossas almas.
Não é bem
assim, concedo, e não havia ainda, julgo eu ,nem Twiter nem Facebook e o dia
exato é 5 de Setembro de 1638.
Esclareça-se que Maria Gomes tinha então 117 anos de idade e foi a mais velha
cristã-nova a ser "salva" pelo fogo purificador da Santa Inquisição.
Cumpre
acrescentar que Maria Gomes esteve presa 2 anos, antes de condenada, foi
submetida à brutal tortura da polée
a interrogatórios e ameças sem fim. Como mandava o regulamento do Santo Ofício,
nunca chegou a saber do que a acusavam em concreto para além de “seguir a lei de Moisés” nem
quem a acusou. Era obrigada, na esperança de se salvar da fogueira a denunciar
o que pensava e não pensava “em seu coração” e quem poderia ter, como ela,
trato com o diabo ao “ser crente na Lei de Moisés”
Com ela
foram queimados vivos nesse dia mais três mulheres e três homens.
Crueldade e Cinismo
Os
inquisidores têm perfeita consciência da hediondez dos crimes e das
consequências negativas para a imagem da Igreja, como agora se diria, das suas
fogueiras onde chegavam a queimar os restos mortais de quem não tinham
conseguido condenar em vida. Por isso a Inquisição condenava à fogueira mas
depois relaxava (entregava) à justiça secular a execução. E fazia-o com
requinte: assim o sermão do padre Manuel Rebelo não podia esquecer as palavras
canónicas para Maria Gomes:
“… a condenam e relaxam à justiça secular a quem pedem com muita
insistência e eficácia se aja com ela benigna e piedosamente e não proceda à
pena de morte nem efusão de sangue.” Condenam à morte e pedem para que “não se
proceda à pena de morte”. E ai dos Magistrados que não cumprissem à risca e
prontamente as ordens da Inquisição. “Eram excomungados e tratados como
hereges”.
A inquisição
foi estabelecida em 1536, no reinado de D. João III e extinta ou, se
preferirem, enviada para os infernos, em 1775, pelo Marquês de Pombal. A
congregação desapareceu em Portugal mas continuou sob a proteção do papado e de
transformação em transformação tem hoje como sua herdeira a Congregação para a
Doutrina da Fé. Sim que uma congregação sagrada, com aquele passado de salvação
de tantas almas, não se deve extinguir, mesmo que já não tenha lume para
fogachar. Mas creio que o Papa, há uns anos, quando estava na moda pedir
desculpa também a pediu para "certos exageros" da Inquisição.
Tudo isto e
muito mais, relata Jorge
Martins, historiador um dos maiores, senão o maior conhecedor da
história dos Judeus portugueses, no seu muito interessante livro
MARIA GOMES CRISTÃ-NOVA, 117 ANOS A MAIS IDOSA VÍTIMA DA
INQUISIÇÃO
agora
editado pela Vega.
Jorge Martins conta-nos com proximidade e rigor o que se passou e como passou com
Maria Gomes, essa nossa concidadã e avó, tão distante e tão próxima, trazida
até nós como uma mulher igual a todas as mulheres que connosco no quotidiano
convivem. Mas o autor oferece-nos também o regimento da Inquisição e o Sermão
daquele Auto-de-má Fé.
Post Scriptum: esqueci-me de dizer algo essencial. É que isto não era condenar
por condenar, incendiar por incendiar, é que quem pagava todas as despesas e
todo a aquele exército de "irmãos" dominicanos do Santo Ofício e
enriquecia o seu inchado e sumptuoso património eram os bens, logo arrestados,
dos judeus nacionais convertidos à força, denominados cristãos-novos.
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Li o livro
fiquei a saber melhor o que nós somos e de onde viemos. E assim, até consigo
perceber melhor que ainda se vá consentindo no governo de Portugal estes Passos
e Relvas, estes Gaspares e Borges. (Pequeno Borges. Não confundir com o
verdadeiro, o argentino José Luís).
Estou
esperançado, no entanto, que lá para Abril ou Maio (são meses bons) consigamos
um bom auto-de-fé para estes “crentes na lei dos Mercados”. Auto-de-fé mas
apenas digital, sem fogo nem polé. Que é que acham.
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